Exposição com Gustavo Sumpta na Galeria Presença, Porto.
True thoughts are those alone
which do not understand themselves.”
Theodor W. Adorno,
Minima Moralia, pt. 3, sct. 122
Os dados estão lançados, temos este tempo de respiração travada, agiremos entretanto suspensos dos frutos das consequências deste gesto. Estes mundos perderam-se das palavras, vivemos um momento de imponderabilidade, como em Solaris, de Tarkovsky, “não há problema”, deixamos a cultura, “está tudo bem”. Tacitamente, abandonamos a regra do discurso e entregamos a nossa intenção ao corpo no espaço.
Entre Mafalda Santos e Gustavo Sumpta existe a dicotomia do deserto, dividido sempre em dois – dia e noite – pela imposição de um território tão perfeitamente homogeneizado, árido. Através de um jogo de oposições, de cores e de materiais, falam da amplitude da distância, criam distância, são trabalhos que se vinculam pelo contraste. Esta separação é potenciadora de percursos e deambulações sobre o vazio das categorias contemporâneas, tão estéreis e depuradas. Sem princípios do mundo, depois da explosão do centro, não restam senão as excursões periféricas e a topologia das redes em convolação que, vivendo da diferença, acabam por definir a qualidade singular do espaço.
Abandonemos, por enquanto, os esforços interpretativos, aceitemos que a sobreposição de discursos possa prejudicar a forma como vemos, estes trabalhos são estes trabalhos – representam, são, processos desconstrutivos das malhas que se impõem sobre nós enquanto criaturas cognitivas. De um e do outro lado, estrutura e fuga; contrastes violentos na tessitura das próprias obras, que colaboram na construção de figurações que se revelam apenas através do corte/da quebra e se alimentam do real através de túneis intestinos. Neste meio tempo, meio momento, todos aguardam a clarificação. É esta etapa de crescimento, o caminho para Roma, que se deseja partido, seja este o meio caminho. Ouvimos de longe as notícias de um grande incêndio que explode a História e liberta-nos das Grandes Narrativas – voltamos ao sensível; teremos de conquistar as pequenas coisas, as simples, para o nosso lado.
Hoje não/hoje sim, o mundo continuará a exalação da dúvida, nela a vida escolhe, cria e inventa. Os troféus são ridículos se não chegar a entender-se a largura da malha e as construções individuais fátuas, quando não nos separamos delas. Esta exposição está entregue, ao olhar e à avaliação, é um momento sem correcção. Tarde ou cedo, os dados vão encontrar a imobilidade, aí teremos respostas e decidiremos a continuidade do jogo.
Texto sobre a exposição de Mafalda Santos e Gustavo Sumpta – Galeria Presença, José Roseira, 2007, Porto.